A campanha eleitoral para as eleições europeias que hoje se realizam em Portugal, trouxeram à tona de água uma série de questões importantes e complexas sobre o estado da democracia no nosso país.
O tema é, normalmente, recorrente em tempos de crise e em períodos eleitorais.
O normal e, por vezes, desenfreado apetite de dirigentes e candidatos partidários pelo controlo e governação da res publica apresenta contornos e situações nem entendidas, nem bem vistas, pela generalidade dos cidadãos. E são estes os verdadeiros detentores do poder em regimes democráticos livres.
Seguindo a campanha eleitoral pelos media, - e para milhões de eleitores essa é a única forma de conhecerem os propósitos dos candidatos – fica-se com uma visão distorcida dos projectos e programas de cada um dos partido.
As reportagens televisivas são, necessariamente, curtas – 1 minutos e trinta a 2 minutos - e não dão para grandes exposições. Além disso, os repórteres de campanha sabem que o que mais se “vende” é a declaração crítica do cabeça de lista ou líder do partido A ao adversário do partido B, e que alimentando a polémica haverá desenvolvimentos no noticiário seguinte.
O jornalista é um contador de estórias da campanha. Devido à sua função mediática constitui, porém, um importante agente/mediador da controvérsia política, a maioria das vezes sem conteúdo, cujos destinatários são a restrita classe política. Facilmente uma “boca” ou uma declaração infeliz, proferida no calor de um comício, é suficiente para incendiar reacções em cadeia, tricas, ditos e desmentidos, que desfocam a campanha das questões importantes da actualidade.
É neste quadro que um número cada vez mais crescente de cidadãos desconsidera a classe política e se afasta das urnas.
Não é por não perceberem nada de política, ou por entenderem que isso é para os senhores do Governon, não. Qualquer cidadão mais ou menos instruído sabe, perfeitamente, avaliar a acção governativa pelos seus efeitos. A maioria das pessoas são comedidas nas críticas aos governantes e têm a noção da dificuldade em gerir a causa pública a contento de todos.
O que o cidadão comum não desculpa é a falta de seriedade dos agentes políticos na abordagem de questões sérias e graves; o cidadão não desculpa discussões estéreis, o falar por falar, a falta de respeito pelas opiniões adversárias, o desprezo por propostas alternativas, a incapacidade de gerar consensos, a intransigência de pequenos e grandes partidos em reconhecer que a verdade não está apenas do lado do mais forte ou do mais bem-falante, mas é uma busca contínua e preocupada pelo bem comum.
O velho ditado popular: casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão, leva o povo a aferir o comportamento das autoridades eleitas para o exercício do poder cujo fundamento primeiro é o povo.
Neste ano de quase todas as eleições, ano de sobressaltos económicos, financeiros e sociais, importa que os representantes eleitos em Portugal ou no Parlamento Europeu, assumam os limites do entendimento, da aproximação de ideias e de projectos, do serviço ao bem-comum.
O pior que poderá acontecer ao eleitor indiferente é ver um seu representante, subjugado aos interesses pessoais ou de grupo, a corporações e a ideologias obsoletas.
Um importante trabalho pedagógico tem de ser desenvolvido junto dos eleitores para os cativar para a participação democrática que vai muito para além do voto.
Só quando os cidadãos se sentirem parte essencial e imprescindível do exercício do poder é que a Democracia será, de verdade, Poder do Povo.
Enjeitar este direito é delegar a autoridade numa autocracia que destrói a cidadania e o bem-comum.
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